sexta-feira, 30 de março de 2012

Hakim Bey - Caos

Caos Por Hakim Bey





O Caos jamais morreu. Bloco primordial não lapidado, único monstro venerável, inerte & espontâneo, mais ultravioleta do que qualquer mitologia (como as sombras antes da Babilônia), a original e indiferenciada unicidade do ser ainda irradia serena como as negras flâmulas dos Assassinos, ao acaso e perpetuamente intoxicadas.

O Caos vem antes de todos os princípios de ordem & entropia, não é um deus nem uma larva, seus desejos idiotas abrangem & definem toda coreografia possível, todos os "aethers" & "phlogistons" sem sentido: suas máscaras são cristalizações de sua própria ausência de rosto, como nuvens.Tudo na natureza é perfeitamente real, inclusive a consciência, não há nada com que se preocupar. Não somente as correntes da Lei foram quebradas, elas nunca existiram; demônios nunca guardaram as estrelas, o Império nunca começou, Eros nunca deixou crescer a barba.

Não, escute, o que aconteceu foi isto: eles mentiram para você, venderam-lhe idéias do bem & do mal, deram-lhe desconfiança do seu corpo & vergonha de sua profecia do caos, inventaram palavras de nojo pelo seu amor molecular, hipnotizaram-lhe com desatenção, entediaram-lhe com a civilização e todas as suas emoções.

Não há devir, revolução, luta, caminho; você já é o monarca de sua própria pele - sua liberdade inviolável espera ser completada apenas pelo amor de outros monarcas: uma política de sonho, urgente como o azul do céu.

Derramar todos os direitos ilusórios e hesitações da história demanda a economia de alguma Idade da Pedra lendária - xamãs e não padres, bardos e não senhores, caçadores e não a polícia, colhedores de uma preguiça paleolítica, gentis como o sangue, desnudando-se por um sinal ou pintados como pássaros, equilibrados na onda de uma presença explícita, o sempre-agora sem relógio.

Agentes do caos lançam olhares ardentes para tudo ou qualquer coisa capaz de testemunhar sua condição, sua febre de "lux et voluptas". Estou acordado somente para o que amo & desejo até o ponto do terror - tudo mais é apenas um mobiliário mortuário, anestesia cotidiana, merda-para-cérebros, tédio sub-réptil de regimes totalitários, censura banal & dor inútil.

Avatares do caos agem como espiões, sabotadores, criminosos do amour fou, nem desinteressados nem egoístas, acessíveis como crianças, polidos como bárbaros, desgastados com obsessões, desempregados, sensualmente loucos, "lobanjos" (lobos-anjos), espelhos para contemplação, olhos como flores, piratas de todos os signos & sentidos.

Aqui estamos engatinhando nas rachaduras entre paredes da igreja estado escola & fábrica, todos os monolitos paranóicos. Decepados da tribo pela nostalgia animal, vamos em busca de palavras perdidas, de bombas imaginárias.

A última "façanha" possível é aquela que define a própria percepção, um invisível fio dourado que nos conecta: dança ilegal nos corredores dos tribunais. Se eu fosse beijar você aqui, chamariam isso de um ato de terrorismo - então vamos levar nossas pistolas para a cama & acordar a cidade à meia-noite como bandidos bêbados celebrando com uma saraivada, a mensagem do gosto do caos.


Autor de TAZ- Zona Autônoma Temporária - editora Conrad / Caos , terrorismo Poético e outros crimes exemplares


sobre o autor... http://pt.wikipedia.org/wiki/Hakim_Bey

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